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Faz quase 50 anos, mas Eurico ainda se lembra com carinho da excursão internacional realizada pelo Palmeiras de maio a junho de 1972. Afinal, o lateral-direito estava em Istambul, na Turquia, onde o Verdão havia disputado amistosos contra Galatasaray-TUR e Fenerbahce-TUR, quando foi convocado para defender a Seleção Brasileira na Taça Independência. A competição, apelidada de Minicopa do Mundo, foi criada para celebrar o aniversário de 150 anos da Independência do Brasil e contou com a participação de 20 países – a equipe verde-amarela se sagrou campeã com vitória sobre Portugal na decisão.

“O Carlos Alberto Torres se machucou e fui chamado para o lugar dele”, lembra-se Eurico, de 73 anos. “Naquela época, viajar de avião não era tão fácil quanto hoje. Tive de pegar um voo para Madri, na Espanha, e outro para São Paulo. Foi uma correria danada, mas valeu a pena, porque representar o Brasil é sempre uma honra. E ainda pude me reencontrar com Leão e Leivinha, que já estavam na Seleção.”

A convocação de Eurico é uma das lembranças mais marcantes da primeira viagem do Palmeiras ao Oriente Médio. A microrregião compreende 18 países de três continentes (África, Ásia e Europa), entre eles os Emirados Árabes Unidos, onde o time alviverde vai disputar a Copa do Mundo de Clubes da Fifa a partir do dia 8 de fevereiro. Em 107 anos de história, o Verdão atuou seis vezes no Oriente Médio e conquistou quatro vitórias, todas elas na temporada de 1972.

O Estádio Amjadiyeh, atual Shahid Shiroudi, recebeu o primeiro jogo do Palmeiras no Oriente Médio (Acervo Histórico)

Chefe de mau humor

A excursão palestrina foi organizada pelo empresário libanês Elias Zacour. À época um dos nomes mais influentes do futebol brasileiro, ele ganhou prestígio na década de 1960 ao levar as principais equipes do Brasil para jogar no exterior – Zacour já havia sido o responsável pela primeira viagem do Palmeiras ao continente africano, em 1969.

Segundo reportagem publicada na edição de 26 de maio de 1972 pelo jornal “Folha de S. Paulo”, o clube recebeu US$ 6 mil por cada uma das oito partidas disputadas ao longo da turnê. A saga teve início na Espanha, com a disputa da Taça Cidade de Zaragoza. Após empates com Zaragoza-ESP e Hamburgo-ALE, ambos pelo placar de 2 a 2, a delegação palmeirense seguiu para o Oriente Médio. A primeira parada foi em Teerã, no Irã, onde o Verdão venceu o Taj-IRA por 2 a 1, em 31 de maio, no Estádio Amjadiyeh – Madurga e Fedato anotaram os tentos.

Primeiro adversário do Alviverde no Oriente Médio, TAJ mudou de nome e escudo

Curiosamente, o Taj (Coroa, no idioma persa) precisaria mudar de nome sete anos depois, por consequência da Revolução Islâmica, que derrubou a monarquia no país. Assumido pelo novo governo, o clube passou a se chamar Esteghlal, que significa Independência em persa.

“Sempre que excursionávamos, jogávamos em estádios cheios e tínhamos a oportunidade de conhecer outras culturas”, recorda-se o ídolo Edu Bala, de 73 anos. “O difícil era aguentar o mau humor do (Oswaldo) Brandão. Saíamos do hotel para fazer compras e, quando voltávamos, ele estava na recepção nos esperando. Queria saber onde tínhamos ido, por que tínhamos demorado”, rememora, entre risos.

Derby internacional?

O Palmeiras ganhou mais um jogo em solo iraniano (diante da seleção de Teerã por 3 a 0, com gols de Madurga, César Maluco e Fedato, em 2 de junho) antes de embarcar para a capital turca Istambul. Lá, nos dias 4 e 7 do mesmo mês, bateu Galatasaray-TUR e Fenerbahce-TUR, respectivamente por 1 a 0 (César) e 2 a 1 (César e Ronaldo). Por coincidência, o time alviverde ficou no mesmo hotel onde estava hospedada a delegação do Corinthians, que também excursionava pelo exterior naquele período.

Folha de S. Paulo informou a recusa do rival à proposta de enfrentar o Palmeiras na Turquia (Acervo Histórico)

De acordo com a edição de 6 de junho de 1972 da “Folha de S. Paulo”, dirigentes do futebol turco insistiram para que os clubes brasileiros disputassem um amistoso no Estádio Nacional de Istambul. Teria sido um Derby especial, uma vez que os arquirrivais, até hoje, nunca nem sequer duelam fora do estado de São Paulo. A diretoria do Corinthians, contudo, rejeitou a possibilidade, “não se interessando nem em saber das vantagens financeiras da exibição”, segundo o periódico.

Com roupa extravagante, César Maluco desembarcou cheio de sacolas (Acervo Histórico)

Roupa de Maluco

O time alviverde encerrou a sua turnê em Argel, na Argélia, com duas partidas em um intervalo de apenas 24 horas: vitória sobre o Milan-ITA por 1 a 0 (gol de Madurga) e derrota para a seleção do Magrebe por 1 a 0, respectivamente nos dias 17 e 18 de junho – Magrebe é uma região do noroeste da África formada por Marrocos, Argélia e Tunísia. O tropeço encerrou uma sequência invicta de 40 partidas da Segunda Academia, como ficaria eternizada a equipe que, ainda naquela temporada, conquistaria os campeonatos Paulista e Brasileiro.

Os craques palestrinos voltaram ao Brasil em 21 de junho e desembarcaram no Aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP). Todos chegaram uniformizados, com exceção do artilheiro César, que surgiu no saguão segurando três sacolas cheias e vestindo terno vermelho, sapatos brancos e camisa marrom. À imprensa presente no local, o ídolo justificou a extravagante roupa e fez um balanço da excursão.

“Desta vez não foi de propósito, não quis ser diferente. É que no Irã rasgaram o meu uniforme, então tive de usar esta roupa mesmo”, afirmou. “Tudo o que ganhei (na viagem), gastei em presentes… Quando embarcamos, eu disse que não estava com muita vontade de viajar. Mas depois mudei de opinião. Por mim, ficava até mais alguns dias. Estávamos faturando bem e conhecendo o mundo.”

Os jogos do Palmeiras no Oriente Médio:

31/05/1972 – TAJ-IRA 1 x 2 Palmeiras
02/06/1972 – Seleção de Teerã-IRA 0 x 3 Palmeiras
04/06/1972 – Galatasaray-TUR 0 x 1 Palmeiras
02/07/1972 – Fenerbahce-TUR 1 x 2 Palmeiras
07/02/2021 – Palmeiras 0 x 1 Tigres-MEX
07/02/2021 – Palmeiras 0 x 0 Al Ahly-EGI

O time que disputou o último jogo antes da excursão de 1972, contra o São Paulo, no dia 21 de maio de 1972 – Em pé: Eurico, João Carlos, Raul Marcel, Dudu, Alfredo e Zeca. Agachados: Fedato, Leivinha, Madurga, Ademir e Nei (Acervo Histórico)