Confiança Animal: a certeza de Edmundo no sucesso do Palmeiras de 1993

Eram passados 36 minutos daquela que seria a partida de consagração de alguns dos nomes mais importantes da história da Sociedade Esportiva Palmeiras. No Estádio Cícero Pompeu de Toledo, o Morumbi, alviverdes e alvinegros duelavam em busca do título do Campeonato Paulista. Edmundo, o Animal, recebeu a bola na ponta esquerda do ataque do Verdão e, ao tentar arrancar em direção ao gol, foi desarmado pelo zagueiro corintiano Henrique. Caprichosamente, a bola sobrou para Evair que, com maestria, rolou para Zinho invadir a área e anotar o primeiro gol palmeirense na tarde de 12 de junho de 1993.

“Depois que o Zinho fez o primeiro gol, as coisas ficaram mais fáceis e acabaram fluindo naturalmente. Nosso time era melhor e, dentro da partida, as situações foram acontecendo. Foi tudo maravilhoso. Eu era jovem e tentava não me prender ao fato de estarmos jogando por anos de fila. Tudo o que queria era entrar em campo e começar a jogar. Dentro do clube, todos nós sabíamos que, se jogássemos o melhor futebol, venceríamos. E foi o que aconteceu”, lembrou o ex-camisa 7 palmeirense ao Site Oficial do Palmeiras, em entrevista concedida em comemoração aos 20 anos da conquista.

Se o dia 12, um sábado, ficou eternamente marcado na memória da torcida do Palmeiras, aquela partida havia começado quase uma semana antes, no sexto dia do mês de junho, domingo, quando o Corinthians venceu o time de Palestra Itália por 1 a 0. O resultado obrigou a equipe comandada por Vanderlei Luxemburgo a vencer o segundo jogo e levá-lo à prorrogação em um estádio com mais de 104 mil pessoas presentes.

“Como o Corinthians ganhou o primeiro jogo, a gente teve que se dedicar em dobro naqueles seis dias que tivemos entre as partidas. E foram dias proveitosos, conseguimos treinar muito bem. Tínhamos muita confiança que faríamos um grande jogo. Fomos ao Morumbi acreditando muito naquele título”, relatou o Animal.

A história garantiu ao Palmeiras que a confiança de Edmundo e dos demais jogadores se transformasse em uma grande atuação do time alviverde. A vitória por 3 a 0 no tempo regulamentar e o gol de pênalti de Evair na prorrogação eternizaram aquela final. Porém, não apenas da conquista sobre o Corinthians viveu o Campeonato Paulista de 1993. Para o Animal, que havia chegado ao clube no início da temporada, a vitoriosa trajetória exigiu muita luta desde os primeiros dias que desembarcou em São Paulo.

Revelado pelo Vasco em 1992, Edmundo foi contratado pelo Palmeiras a peso de ouro no ano seguinte. “Quando eu cheguei ao Palestra, o elenco já estava em pré-temporada, mas fui muito bem recebido por todo o grupo. Eles tinham sido vice-campeões do Campeonato Paulista um ano antes, e a Parmalat trouxe vários jogadores que se destacaram em outras equipes. Eu cheguei, Edilson chegou, repatriaram o Antônio Carlos, veio o Roberto Carlos… foi tudo planejado para que tivéssemos uma equipe muito forte.”

Se para o Palmeiras o dia eternizado foi 12 de junho, Edmundo pode se lembrar de outras duas datas em suas primeiras semanas de clube. No dia 27 de janeiro, o Alviverde estreou no Campeonato Paulista de 1993, com o Animal escalado ao lado de Zinho, Edílson e Evair na linha ofensiva – o mesmo quarteto que disputaria a final da competição. A partida, a primeira do camisa 7 pelo Verdão, foi contra o Marília, no Palestra Itália. Catatau abriu o placar para os visitantes logo aos dois minutos de jogo, mas Evair, aos 23, e César Sampaio, aos 26, trataram de virar o jogo para o time da casa.

“Nós todos tínhamos uma expectativa muito grande que aquele time poderia dar certo, que aquele time faria história. No começo, como nesse jogo contra o Marília, a falta de entrosamento ainda nos atrapalhava um pouco, mas logo os resultados começaram a aparecer com mais facilidade e aquele grupo se tornou muito forte”, relembrou.

Após a primeira partida do campeonato, o Verdão enfrentou o XV de Piracicaba (vitória por 2 a 0, com dois gols de Evair) e o Rio Branco (empate em 2×2, novamente com dois gols do Matador), mas Edmundo não conseguiu balançar as redes. Na quarta partida da temporada, o primeiro clássico. No Morumbi, o Palmeiras enfrentou o Santos, venceu por 3 a 1 e, enfim, o Animal marcou seu primeiro tento com a camisa palmeirense.

“Lembro-me perfeitamente desse jogo. Havia uma pressão grande, tantas contratações caras, então todos estavam um pouco pressionados para mostrar resultados dentro de campo. Nosso time estava invicto na competição, mas eu ainda não tinha marcado. Havia a expectativa para que eu fizesse meu primeiro gol… a torcida pedia, eu também pensava muito nisso. Demorou um pouco, mas acabou sendo tudo na hora certa, na melhor hora. Foi um gol em clássico, que acabou aliviando um pouco o peso que eu tinha por estar sem marcar. Jogos assim, independentemente da fase que aconteçam, são sempre diferentes.”

Ao todo, Edmundo marcou 99 gols em 223 jogos pelo Palmeiras, somando suas duas passagens entre 1993 e 1995 e 2006 e 2007. Apenas no Campeonato Paulista de 1993, foram 34 partidas e 11 tentos. Também por ter sido o clube que mais atuou em sua carreira, o Animal costuma dizer que tem pelo Verdão um amor “como se fosse de mulher, de esposa”, enquanto o Vasco da Gama, time que torceu na infância e foi revelado, era um “amor de mãe”.

“Eu amo os dois clubes da mesma forma. Algumas pessoas às vezes não entendem, mas não adianta eu ser hipócrita. Nasci no Rio e era vascaíno, por isso o amor de mãe. Nós nascemos e já amamos aquela pessoa. O Palmeiras foi um amor de mulher, um amor que conheci ao longo da vida e acabou sendo um casamento que deu muito certo. Por isso eu digo: onde eu nasci, no Vasco, o amor é de mãe. Do Palmeiras, que conheci ao longo da vida, como amor de mulher”, explicou.

Após Vasco e Palmeiras, Edmundo acabou deixando o Alviverde para jogar no Flamengo, em 1995, no ataque que, à época, foi chamado de “melhor ataque do mundo”, ao lado de Sávio e Romário. Em sua volta ao Rio de Janeiro, porém, as coisas não deram certo para o Animal, que garante ter se arrependido de deixar o Palestra Itália.

“Me arrependi muito. Não só por não ter ido bem no Flamengo, por tudo que aconteceu comigo no Rio de Janeiro, mas também porque eu tinha 100% do carinho do torcedor do Palmeiras e em uma decisão sem pensar acabei perdendo tudo. Hoje olho para trás e vejo que tomei a decisão errada. Vejo o Marcos, que fez uma carreira só no clube e até hoje é incrivelmente idolatrado. Eu queria ter ficado, queria ter escolhido ficar, e sei que poderia ter tido também um reconhecimento ainda maior por tudo que fiz e por tudo que poderia ainda ter feito pelo clube”, lamentou o hoje comentarista esportivo, que em 2011 foi homenageado pela diretoria palmeirense no evento de lançamento de uma camisa listrada, alusiva à de 1993.