De ofensa a xodó: 30 anos da adoção do porco como mascote da torcida
Thiago Kimori
Departamento de Comunicação
"E DÁ-LHE PORCO… E DÁ-LHE PORCO… OLÊ… OLÊ… OLÊ!". Foi com esse canto que, há exatos 30 anos, começou a história do porco como mascote da torcida do Palmeiras. O dia era 29 de outubro de 1986, e o palco era o Estádio do Pacaembu. O adversário, assim como neste sábado, era o Santos, em um duelo válido pelo Campeonato Brasileiro. Em meio à alegria pelo bom momento da equipe, que venceria o clássico por 1 a 0, gol de Mirandinha, os torcedores quebraram um tabu que já durava quase duas décadas e soltaram a voz para reverenciar o novo símbolo alviverde. Desde então, o porco virou figura constante nas músicas entoadas nas arquibancadas.
O novo xodó levou algum tempo para cair nas graças da torcida, afinal, o apelido era usado por rivais como ofensa aos palmeirenses. Tudo começou em 1968, quando o Palmeiras foi contra a substituição de dois jogadores na lista de inscritos do Corinthians para a disputa do Campeonato Paulista daquele ano. O episódio fez com que parte da imprensa chamasse os dirigentes palestrinos de porcos, alcunha que também era usada contra os fascistas na época da Segunda Guerra Mundial. A partir de então, as torcidas rivais começaram a usar a expressão como provocação aos palmeirenses nas arquibancadas.
Em 1983, por inciativa do então gerente de marketing João Roberto Gobbato, surgiu pela primeira vez a ideia de assumir o apelido pejorativo e transformá-lo em um mascote do clube. Alguns cartolas mais antigos rejeitaram de imediato a proposta, mas ela ganhou força entre as torcidas organizadas. Uma das torcidas, no ano seguinte, chegou a comercializar porquinhos de porcelana para a torcida. As vendas foram um sucesso, e ajudaram a fortalecer a ideia da adoção do novo símbolo. Para os jovens palmeirenses, tratava-se de um golpe no conservadorismo e um passo rumo à modernidade.
A iniciativa de Gobbato foi amadurecendo até que naquele 29 de outubro de 1986 o “Dá-lhe Porco” foi ouvido pela primeira vez nas arquibancadas. No jogo seguinte, diante do São Paulo, no Morumbi, o novo mascote foi integrado de vez. Torcedores levaram um porco vivo ao gramado, desfilaram em campo com fantasias e bandeiras do novo xodó e, desta vez de forma unânime, exaltaram o suíno nas arquibancadas.
Já firmado pela torcida, chegava a hora de o porco também ganhar espaço na imprensa esportiva. Em novembro de 1986, a conceituada Revista Placar estampou em sua capa uma foto histórica do meia Jorginho Putinatti, um dos símbolos do Palmeiras na década de 80, carregando um porco no colo. Na oportunidade, a edição da revista ganhou enorme repercussão e ficou marcada como um dos principais capítulos da história palestrina. “Gostei da musiquinha e do impacto deste novo grito de guerra”, contou Putinatti, enquanto se preparava para a sessão de fotos da revista, já com o animal em mãos.
Na temporada seguinte, um ritual foi adotado: a equipe do Palmeiras começou a entrar em campo com um porco de porcelana, e alguns atletas, em especial o meia Edu Manga, junto a alguns torcedores, faziam o percurso entre uma meta e outra com o objeto. Em uma partida frente ao Botafogo-SP, em Ribeirão Preto-SP, um torcedor local invadiu o gramado e quebrou o então amuleto alviverde, mas ele foi reconstruído e utilizado até a eliminação na semifinal do Campeonato Paulista.
Em 2015, a figura do porco voltou a fazer parte das
partidas do Palmeiras, justamente no ano em que o clube levantou mais um caneco da Copa do Brasil. Horas antes da goleada por 4 a 0 sobre o São Paulo, dentro do Allianz Parque, no dia 28 de junho, pelo Brasileirão, o Alviverde estreou o seu dirigível oficial com o formato de um porco, que sobrevoa até hoje a arena antes e no intervalo dos jogos do Verdão. Além do “porcão voador”, como ficou conhecido o dirigível pela torcida, um túnel inflável também foi instalado na saída do vestiário do Palestra para engrandecer ainda mais a entrada da equipe em campo.
Para a partida do próximo domingo diante do Internacional, relembrando o ocorrido de 30 anos atrás, quando o jogo seguinte ao do dia 29 de outubro serviu para homologar a adoção do porco, uma série de ações comemorativas estão previstas no Allianz Parque. Será uma semana inteira de homenagens para a torcida.
Entrevista de Putinatti à Revista Palmeiras
A atual edição da Revista Palmeiras, distribuída no começo de outubro, traz uma reportagem especial com o ex-jogador Jorginho Putinatti, um dos símbolos do clube na aceitação do porco como mascote. O ex-camisa 7, que é tratado com respeito pelos torcedores mesmo sem ter ganhado um título pelo Verdão, relembra com carinho o episódio que ficou marcado em sua história como atleta, quando foi capa da Revista Placar segurando um porco no colo
“Era uma ofensa. Mas havia um movimento para mudar isso, e as torcidas do clube concordavam. Na época, a Placar procurou a diretoria sob a alegação de eu ser uma referência. Confesso que, passados 30 anos, jamais poderia imaginar que seria lembrado por isso. O que mais me recordo da sessão de fotos era o porquinho. O bichinho gritava muito (risos)”, contou.
Putinatti revelou, inclusive, que o acolhimento do novo mascote serviu como motivação para aquela equipe do Palmeiras. “Um olhava para o outro e dizia: vai ser porco agora? Vamos abraçar a ideia, então. A gente ficava bravo quando os adversários falavam. Até que teve um clássico, em 86, e, quando entramos em campo, começou o ‘Dá-lhe Porco’. O sentimento geral do grupo foi bom. Achávamos até que seria um fato novo para brigar pelo título”, recordou. “Iríamos dar a volta olímpica com o porco”, completou.
Periquito: mascote mais antigo
O mascote oficial do Palmeiras é o periquito, adotado ainda em 1917 pelos torcedores do Palestra Italia, quando o uniforme totalmente verde começou a ser utilizado. A escolha se deu também pelo fato de que existiam muitas aves deste tipo nos bosques do Parque Antarctica. Os primeiros registros oficiais do periquito, no entanto, apareceram somente nos anos 40, logo após os incidentes que fizeram com que o Brasil entrasse na Segunda Guerra Mundial e o Palestra mudasse definitivamente o seu nome para Palmeiras. O periquito ganhou força entre os torcedores e os jornalistas esportivos, tornando-se o símbolo do clube mais vitorioso do Brasil.
Veja abaixo como foi a vitória do Palmeiras sobre o Santos, em 1986: