Departamento de Comunicação e Departamento de História

Jair jogou no Palmeiras de 1949 a 1955, somou 248 partidas e fez 74 gols (Acervo Histórico)

Neste domingo (21), o Palmeiras celebra o aniversário do ídolo nacional Jair Rosa Pinto, que completaria exatos 100 anos se estivesse vivo nessa data. Jair foi não só um dos melhores meias-esquerdas da história do Verdão, como também o principal de toda a sua geração – décadas de 40, 50 e início de 60-, tendo sido protagonista em todos os clubes que defendeu, inclusive na Seleção Brasileira, pela qual disputou uma Copa do Mundo como camisa 10 e titular. No Palmeiras, Jair atuou de 1949 a 1955 e acumulou 248 jogos (145 vitórias 46 empates e 57 derrotas), marcando 74 gols. Além do Maior Campeão do Brasil, o jogador também era identificado com clubes como Vasco, Flamengo e Santos.

Jair Rosa Pinto nasceu no dia 21 de março de 1921. Jajá de Barra Mansa, como ficou eternizado no mundo da bola, na verdade era de Quatis, cidade carioca que em 1990 se emancipou do município de Barra Mansa. Seu outro apelido, dado por companheiros e adversários do futebol, era “Coice de Mula”, pois, apesar das pernas finas, batia na bola com uma potência incrível.

O eterno camisa 10 do Verdão (foi um dos primeiros, inclusive, a utilizá-la, já que ele chega ao Alviverde em 1949, e a numeração em camisas passa a ser utilizada a partir de 1948 – portanto, Eduardo Lima foi o primeiro 10 do Verdão) é mais um dos casos de jogadores que vêm de uma família de boleiros: ele tinha um irmão mais velho, chamado Orlando, que chegou a jogar no Vasco da Gama na década de 30, em um plantel recheado de grandes craques do futebol carioca à época, como Leônidas da Silva, Fausto e Domingos da Guia (pai de Ademir da Guia, maior ídolo da história do Palmeiras), dentre outros.

Jair Rosa Pinto era conhecido como ‘Jajá de Barra Mansa’ (Acervo Histórico)

Jair havia começado no futebol em Mendes (outra cidade nas imediações da sua) em um time do frigorífico local; de lá, foi para o Barra Mansa FC, onde tudo começou a mudar: em 1938, “Jajá de Barra Mansa”, como já era chamado, tinha 17 anos e, com suas atuações no time de sua cidade, chegou ao modesto Madureira, ainda muito magro e franzino, e pela nova equipe disputou o Campeonato Carioca, sendo o principal destaque do time um dos grandes destaques daquela edição torneio.

Em 1939, o treinador Ademar Pimenta, famoso no Rio de Janeiro, efetivou Jair ao time principal definitivamente e, ao lado de Isaías e Lelé, o jogador formou um trio que jamais saiu da memória dos torcedores do Madureira. Porém, o trio ganhou uma alcunha pitoresca: foram chamados, carinhosamente, de ‘Os Três Patetas’, em alusão aos personagens Moe, Larry e Shemp, famosos pelos filmes de comédia naquela época. Mas a verdade é que o trio futebolista foi uma sensação, conquistando, inclusive, o primeiro título da história do clube: o torneio início de 1939, em final disputada contra o Flamengo.

Centralizados, Lelé, Isaías (com a bola) e Jair Rosa Pinto fizeram sucesso no futebol carioca (Acervo Histórico)

ASCENSÃO NA CARREIRA

Curiosamente, Jair, meia esquerda, e seu companheiro Lelé, meia direita, ambos revelações do Madureira, antes mesmo de serem convocados para servir o Selecionado Carioca, foram chamados para vestir a camisa da Seleção Brasileira em 1940 para disputa da Copo Roca na Argentina – Jair, com apenas 19 anos. Episódio este que foi considerado fato raro, pois, os demais atletas, normalmente, passavam primeiro pela Seleção Estadual antes de chegarem à Seleção Nacional.

CHEGADA AO VASCO

Ao lado de Lelé e também de Isaías, seus companheiros desde os tempos de Madureira (a partir de 1938), Jair Rosa Pinto fez tanto sucesso que o Vasco contratou os três como reforços para a temporada de 1943. No Gigante da Colina, Jair permaneceu por quatro anos e despontou de vez para o futebol brasileiro como o grande craque de sua posição, conquistando o Estadual de 1945 e permanecendo até 1946.

Jair Rosa Pinto disputou a Copa de 1950 sendo o camisa 10 do Brasil (Acervo Histórico)

IDA PARA O FLAMENGO E TRANSFERÊNCIA PARA O VERDÃO

Em 1947, foi jogar no Flamengo. Fez seu nome também no clube da Gávea e criou identificação. Entretanto, em 1949, após alguns problemas internos e uma sequência ruim, somadas a um revés do time Rubro-Negro por 5 a 2 para seu ex-clube, o Vasco, em 1949, alguns dirigentes o responsabilizaram pela goleada sofrida e, verdade ou mito, eternizou-se uma história de que sua camisa 10 teria sido queimada no vestiário após seu afastamento do time, embora o próprio jogador jurasse por Deus até o fim da vida que a história da camisa queimada não passava de invenção de Ari Barroso, jornalista rubro-negro fervoroso, com quem havia brigado.

O fato é que a relação entre Jair Rosa Pinto e Flamengo estava estremecida e não havia mais clima. Foi aí então que entrou o Palmeiras na história: o Verdão demonstrou interesse pelo craque das canelas finas (mas que tinha um canhão no pé esquerdo, um verdadeiro ‘coice de mula’) e Jair seguiu para o Parque Antarctica.

Portanto, já renomado, Jair chegou ao Palmeiras após vestir as camisa do Flamengo e do Vasco. Como atleta do Verdão, disputou a Copa do Mundo de 1950 como titular, competição da qual ele nunca deixou de sonhar com a bola que quase evitou o Maracanazo no último lance. Naquele Mundial, inclusive, foi considerado o melhor jogador da Copa, além de ter sido o primeiro camisa 10 da Seleção na história das Copas – antes deste torneio, as camisas não possuíam numeração.

“Eu fiz de tudo e a bola raspou, ela raspou na minha cabeça. Sonhei muito com o gol que perdi. Não, sonhei muito com o gol que não fiz de cabeça. Sempre antes de dormir eu penso no gol. Só sonho com o último lance, aos 44 minutos e 50 segundos. Eu sonhava assim: o Brasil com um time daquele não ganha a Copa do Mundo? Isso era o sonho. E então eu acordava espantado. Aí eu olhava assim e o Maracanã estava na minha frente”, contou Jair, anos depois, em entrevista a Geneton Moraes Neto para o livro Dossiê 50. O camisa 10 não conseguiu cabecear em cheio. E, sem o tiro fatal, o árbitro apitou o final do jogo. O Uruguai era campeão.

A ESTREIA PELO PALMEIRAS

Jair estreou pelo Palmeiras no dia 01 de setembro de 1949, contra a Portuguesa, no Pacaembu, em partida amistosa. Cobrador de faltas com rara precisão, ele tinha fama de fazer gol de faltas com efeito por cima da barreira e, na ocasião, havia uma lenda de que se não houvesse barreira (ou seja, a cobrança fosse direta à meta) ele não faria o gol. O arqueiro da Lusa daquela partida então, Caxambu, resolveu, em uma cobrança de falta, tirar a barreira. Em uma pancada de longe, a um palmo do chão, Jair fez valer seu apelido de coice de mula, chutou e Caxambu nada pôde fazer senão observar a bola entrar bem no canto. Aquele duelo foi vencido pelo Verdão por 3 a 1, e os outros dois gols palmeirenses foram marcados por Lima e Washington.

Oberdan, Jair (ao centro) e Nestor ao fim da partida conhecida como ‘O Jogo da Lama’ (Acervo Histórico)

JOGO DA LAMA

Jair foi personagem central de uma das partidas mais emocionantes da história do clássico entre São Paulo e Palmeiras, o famoso Choque-Rei. No dia 28 de janeiro de 1951, o Palmeiras entrou em campo contra o São Paulo, jogando pelo empate. A partida era válida pelo Campeonato Paulista de 1950, e as duas equipes, que vinham disputando o título ponto a ponto, tinham chance de levantar o caneco.

Debaixo de muita chuva o São Paulo conseguiu abrir o placar. Teixeirinha bateu, a bola desviou em Turcão (zagueiro palmeirense) e morreu no fundo das redes do goleiro Oberdan Cattani. Após o árbitro inglês Alwyn Bradley decretar o fim do primeiro tempo, os jogadores do Palmeiras, devidamente abatidos, desceram ao vestiário e foram surpreendidos por Jair, que, aos berros, exigiu raça ao time verde.

No intervalo, ele chegou para seus companheiros e disse: “A única chance que temos é a seguinte: todo mundo que pegar a bola, toca pra mim que eu vou lançar pra frente. Uma hora faremos um gol”. E foi exatamente o que aconteceu. Aos 15 minutos do segundo tempo, Jair dominou a bola e fez um de seus incríveis lançamentos (o que, aliás, era uma das especialidades do craque). A bola, contudo, parou em uma poça do inundado Pacaembu e sobrou para o atacante Aquiles, que empatou a partida e garantiu o título ao Maior Campeão do Brasil, que levantou o seu 11º caneco estadual dos 23 que hoje possui.

CAPITÃO DA COPA RIO

Uma famosa história que mexe com o brio de todo palmeirense é de que o time alviverde resgatou a honra do futebol brasileiro em 1951, com a conquista do primeiro mundial de clubes disputado em toda a história, com aval da Fifa, exato um ano após a Seleção Brasileira ter sofrido, até então, com a sua pior derrota em uma Copa do Mundo – revés este que iria assombrar o time canarinho por muitas décadas (foi quando o Brasil perdeu a Copa para o Uruguai, no Maracanã, e o episódio ficou conhecido como Maracanazo).

Jair Rosa Pinto, capitão do Palmeiras na final do Mundial de 1951, cumprimenta o capitão da Juventus-ITA, Parola (Acervo Histórico)

E Jair Rosa Pinto foi um personagem que esteve presente naqueles dois momentos: tanto na derrota brasileira diante da Celeste Olímpica, quanto na vitória palmeirense sobre a Juventus da Itália, time contra o qual o Verdão foi campeão do mundo no mesmo Maracanã inundado de lágrimas exato um ano antes.

O então camisa 10 do Palmeiras foi o capitão do time na maior parte do tempo que defendeu a equipe, inclusive na importante campanha da Copa Rio. Ele cumprimentou o capitão da Juventus, Parola, e ergueu o troféu após o empate por 2 a 2 que decretou o título ao Verdão (o jogo de ida havia sido 1 a 0 a favor do Palmeiras).

A 10 e a faixa: o capitão Jair Rosa Pinto levantou a taça da Copa Rio (Acervo Histórico)

Assim como em 2020 o Palmeiras conquistou a Tríplice Coroa (Paulista, Libertadores e Copa do Brasil), os títulos conquistados pelo Verdão (que dominava o cenário futebolístico naquela época) entre 1950 e 1951 ficaram conhecidos como ‘As Cinco Coroas’ e, além do Campeonato Paulista de 1950 e do Mundial de 1951, também fizeram parte dessas conquistas a Taça Cidade de São Paulo de 1950 e 1951 e o Torneio Rio-São Paulo de 1951.

Entre 1950 e 1951, o Palmeiras conquistou as Cinco Coroas (Acervo Histórico)

DESPEDIDA DO PALMEIRAS E RUMO AO SANTOS

Aos 34 anos, ao fim de 1955, Jair Rosa Pinto deixou o Verdão. Como não tinha histórico de lesão ao longo de toda a carreira, ainda tinha vitalidade para jogar por mais algum tempo em alto nível. Ainda tinha lenha para queimar. Escolheu o Santos para esta nova etapa de sua vida no futebol. A equipe santista, aliás, era a experiência que faltava na carreira de Jair.

Pagão, Dorval, Jair, Pelé e Pepe, uma das principais linhas ofensivas da história do time santista

Lá, ele formou uma das melhores linhas ofensivas da história do time alvinegro, ao lado de Pagão, Dorval, Pelé e Pepe. Pelé, o Rei do Futebol, na oportunidade, era novato: Jair chega ao Peixe em 1956, mesmo ano em que Pelé surge no Alvinegro Praiano. Portanto, Jair foi uma espécie de mentor do Rei, nas palavras do próprio Pelé, que disse ter aprendido muito com ele. A moral de Jair Rosa Pinto no Santos, já veterano à medida em que Pelé estava começando, era tanta, que ele tinha carta branca, inclusive, para dar “puxões de orelha” nos meninos da Vila daquela época, incluindo o garoto Edson Arantes do Nascimento. No Peixe, o craque carioca conquistou os Paulistas de 1956, 1958 e 1960.

Após deixar o Santos em 1960, Jair Rosa Pinto ainda transferiu-se ao São Paulo, onde jogou a temporada de 1961 aos 40 anos, ainda com brilho. Depois, entre 1962 e 1963, ainda no Tricolor, seu condicionamento físico já não permitia, cada vez mais, gradualmente, que jogasse em alto nível. Então, em 1963, aos 42 anos, ele deixa o time do Morumbi e segue para a Ponte Preta, onde faz uma única temporada como jogador e treinador e pendura, definitivamente, as chuteiras.

CARREIRA COMO TREINADOR

A partir de 1963, Jair Rosa Pinto seguiu no futebol na função de treinador e passou a aceitar convites para trabalhar. Dirigiu clubes como São Paulo, Ponte Preta, Santos, Fluminense, Olaria e Madureira (onde tudo começou), dentre outros. Entretanto, jamais conseguiu repetir o mesmo sucesso que teve como jogador.

HOMENAGEM DOS 50 ANOS DA COPA RIO E MELHOR IDADE

Nos últimos anos de vida, Jair passava boa parte do seu tempo cuidando dos muitos passarinhos que criava e relembrando os seus momentos de glória no futebol, conversando com amigos da velha guarda na Praça Saens Peña, a principal da Tijuca, na Zona Norte do Rio, bairro em que morava e onde treinou garotos do morro do Borel.

Em 2001, quatro anos antes do falecimento de Jair (em 28/07/2005), o Palmeiras reuniu os remanescentes daquela conquista de 1951, no aniversário de 50 anos daquele título. Jair Rosa Pinto, um dos principais nomes daquele grupo, foi aclamado na ocasião e, já com idade avançada, chegou a enaltecer a conquista em entrevistas e, muito emocionado, rever a taça que trouxe para São Paulo cinco décadas antes.

Campeões de 1951 reunidos, em 2001, em homenagem feita pelo Palmeiras aos remanescentes daquele título; Jair está ao centro, segurando a taça (Acervo Histórico)

CARTA DE CARLOS CONY

Carlos Heitor Cony, que viveu até 2018 (91 anos), membro da Academia Brasileira de Letras, na ocasião da morte de Jair Rosa Pinto, em 28 de julho de 2005, publicou um texto em homenagem ao craque relatando a sua visão sobre o jogador como torcedor e apaixonado pelo futebol. Confira na íntegra:

Semana passada, morreu Jair Rosa Pinto, aqui no Rio, cidade que ele encantou com o maravilhoso futebol que jogou durante quase duas décadas (1940-1950). Com perdão de Pelé e Garrincha, considero Jair, ao lado de Didi, os dois maiores craques que meus olhos viram jogar.

Bem verdade que o futebol, embora conservando as mesmas regras, mudou de tal forma as táticas que praticamente transformou-se em novo tipo de jogo. Deixou de ser arte para ser esporte. O time tricampeão da Copa de 70 perderia hoje para o Anapolina. Os atletas, em geral, ganharam resistência maior, melhor preparo físico. Johnny Weissmuller, campeão olímpico de natação em 1928, perderia hoje para um infanto-juvenil do Fluminense. As marcas olímpicas são anualmente superadas.

Voltando ao futebol e sobretudo a Jair. Ele jogava parado, como Beckenbauer, a bola vinha até ele. Driblava pouco, tinha uma fabulosa visão de jogo, seus passes de 40 metros, tais como os de Didi, colocavam o companheiro frente a frente com o goleiro. Era dono do chute mais potente dos gramados, um chute que até hoje não teve igual.

Integrou o trio atacante mais famoso do nosso futebol (no tempo em que a armação em campo era 2-3-5): Zizinho, Ademir e Jair, trio que brilhou (apesar da derrota final) na melhor seleção que tivemos, a de 1950.

Num jogo em que o Flamengo perdeu para o Vasco, Zé Lins do Rego foi ao vestiário consolar os jogadores do seu time. Quando abraçou Jair, deu um grito: “Você não molhou a camisa, ela está seca!”. O romancista deu um jeito e levou a camisa 10 para a Galeria Cruzeiro, que era então o centro do centro do Rio. Fez um comício, um discurso indignado e queimou a camisa de Jair para provar que não estava molhada.

Pouco depois, mesmo sem molhar a camisa 10, durante a Copa de 50, Jair foi considerado pela imprensa internacional o melhor jogador do mundo.

FICHA TÉCNICA

Nome
Jair Rosa Pinto

Data de nascimento
21 de março de 1921

Local de nascimento
Quatis-RJ

Data de falecimento
28 de julho de 2005

Posição: Meia
Número de temporadas:
7
Clube anterior: Flamengo-RJ
Jogos: 248 (145 vitórias, 46 empates e 57 derrotas)

Estreia: Palmeiras 3×1 Portuguesa (01/09/1949)
Último jogo: Palmeiras 0x3 XV de Jaú (06/11/1955)

Gols: 74
Primeiro gol: Palmeiras 3×1 Portuguesa (01/09/1949)
Último gol: Palmeiras 3×3 Jabaquara (23/10/1955)

TÍTULOS

Barra Mansa
Taça da Prefeitura Municipal: 1938

Madureira
Torneio Início:
1939

Vasco da Gama
Campeonato Carioca:
1945

Palmeiras
Copa Rio: 1951
Torneio Rio-São Paulo: 1951
Campeonato Paulista: 1950
Taça Cidade de São Paulo: 1950 e 1951

Santos
Torneio Rio-São Paulo:
1959
Campeonato Paulista: 1956, 1958, 1960
Taça dos Campeões Estaduais de São Paulo e do Rio de Janeiro: 1957

Seleção Brasileira
Copa América: 1949