Texto originalmente publicado na edição 49 da Revista Palmeiras. Para conferir o conteúdo completo, seja sócio Avanti e clique aqui para ter acesso à revista digital do Verdão. 

De julho de 1967 a janeiro de 1970, a Nigéria foi devastada por uma guerra civil. Estima-se que o conflito entre os povos haúças e ibos tenha causado a morte de mais de 2 milhões de pessoas. Artistas famosos, como os músicos Jimi Hendrix e John Lennon, uniram-se à ONU (Organização das Nações Unidas) para pedir, sem sucesso, o cessar-fogo na região.

Acervo Histórico _ O Verdão enfrentou a Seleção do Congo em uma das partidas pela África

Em meio a esse clima de tensão e violência, o Palmeiras desembarcou no país africano para cumprir a última parte da viagem ao chamado Continente Esquecido. De julho a agosto de 1969, o clube disputou sete amistosos na África. A excursão, organizada por um empresário chamado Elias Zacur, começou em Kinshasa, no Congo, passou por Kumasi e Acra, em Gana, e terminou nas cidades de Lagos e Ibadan, na Nigéria.

O roteiro foi semelhante ao percorrido meses antes pelo Santos, de Pelé. Para resgatar a história da jornada palestrina, a Revista Palmeiras consultou jornais da época e entrevistou ídolos palmeirenses que embarcaram naquela aventura, cinco décadas atrás.

Campeão do mundo com a Seleção Brasileira em 1970, o ex-zagueiro Baldochi, de 73 anos, ainda se recorda da comoção provocada pela visita da delegação alviverde ao continente. “A exemplo do Santos, nós mobilizamos a região”, conta. “Eu me lembro bastante da alegria daquelas pessoas que, quando nos viam, se esqueciam um pouco da guerra. Conquistamos a admiração e o carinho dos nigerianos.”

Uma viagem divina

O então técnico do Palmeiras, Rubens Minelli, guarda na memória um episódio curioso. “Quando íamos jogar no interior da Nigéria (Ibadan), o nosso ônibus foi parado em uma área militar. Não podíamos ultrapassar a barreira porque era perigoso. Os soldados só nos deixaram passar porque eram fãs do Cardoso”, rememora o ex-treinador de 90 anos, citando o atacante que brilhou na excursão, durante a qual fez dez gols.

O craque Ademir da Guia também foi idolatrado pelos africanos. De acordo com reportagem publicada pelo jornal “Folha de S. Paulo” no dia 25 de julho de 1969, “o interesse do público (pelo Palmeiras) é muito grande, principalmente pela apresentação de Ademir da Guia, que já se tornou ídolo da torcida e é o mais procurado para autógrafos”.

A atenção despertada pelo Divino, porém, não decorria apenas do seu futebol elegante. “Muitos ficavam abismados porque não entendiam como o Ademir podia ser loiro e ter traços de negro”, comenta o ex-lateral Zeca. “Nossa impressão era que eles não tinham conexão com o resto do mundo, não conheciam outras etnias. Mas eram bem acolhedores. No aeroporto, faziam uma espécie de corredor só para tocar na gente.”

Histórias para contar

Durante a viagem, o Verdão enfrentou dificuldades logísticas. No Congo, por exemplo, a equipe teve de se hospedar em uma universidade. “Tudo era improvisado. Ficávamos onde dava, dormíamos onde era possível, mas sempre dentro de uma condição mínima aceitável”, ressalta Zeca.

Outro problema foi a qualidade dos estádios. Segundo matéria da “Folha de S. Paulo” de 27 de julho daquele ano, “o time palmeirense sentiu (em Gana) uma dificuldade comum na África: carência de campos gramados”. “Chegamos a jogar no terrão mesmo”, diz o ex-lateral de 73 anos.

Zeca rememorou outra história engraçada vivenciada pelo time em território africano. “Um dia, pegamos uma barca para atravessar um rio. Quando chegamos do outro lado, uns caras enormes vieram carregar o nosso material, como sacos de bolas e chuteiras. Eles pediram uma gorjeta, mas a nossa diretoria não quis pagar. Então, os caras pegaram o material de volta e jogaram tudo na rua”, conta, entre risos.

Viagem histórica

O caminho percorrido pela delegação palestrina no continente africano:

De São Paulo para Kinshasa (Congo) – 6,9 mil km
18/7 – Palmeiras 4 x 3 Seleção de Kinsasha
20/7 – Palmeiras 1 x 3 Seleção do Congo

De Kinshasa (Congo) para Kumasi (Gana) – 3,7 mil km
25/07 – Palmeiras 2 x 1 Cornerstone-GAN

De Kumasi (Gana) para Acra (Gana) – 250 km
27/07 – Palmeiras 1 x 1 Great Olimpics-GAN

De Acra (Gana) para Lagos (Nigéria) – 460 km
02/08 – Palmeiras 4 x 1 Stationery Stores-NIG
06/08 – Palmeiras 2 x 0 Seleção da Nigéria B

De Lagos (Nigéria) para Ibadan (Nigéria) – 130 km
10/08 – Palmeiras 3 x 2 Seleção da Nigéria