Há 55 anos, Pai da Bola deixava os campos e era imortalizado em busto

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Waldemar Fiume defendeu o clube por 17 anos. Ajudou o Palestra Italia a morrer líder e o Palmeiras a nascer campeão em 1942. Lavou a alma do povo brasileiro com o título mundial de 1951. Ganhou o apelido de Pai da Bola pela qualidade do seu jogo e pela capacidade tática para atuar em diversas posições. E está imortalizado com um busto de bronze no Parque Antártica ao lado de outras duas lendas alviverdes, Ademir da Guia e Junqueira.

Motivos não faltam para que Waldemar Fiume seja considerado um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro. A trajetória com a camisa verde foi encerrada há exatos 55 anos, em um clássico contra o São Paulo disputado no dia 17 de setembro de 1958. Mas, para os palmeirenses, Fiume será eterno.

Início na várzea e Arrancada Heroica

Antes de se tornar jogador profissional no Palmeiras, Waldemar Fiume (*12/10/1922 +06/11/1996) exibia-se nos antigos campos de várzea do Glicério, bairro da capital paulista. Foram suas habilidades com a bola nos pés e o bom condicionamento físico que o levaram ao clube que o consagrou. Debutou no quadro principal do Palestra Italia em 14 de setembro de 1941, na goleada por 4 a 0 diante do Comercial da Capital.

Logo em seu primeiro ano de Palmeiras, o polivalente participou de um dos episódios mais emblemáticos dos 99 anos de história do Verdão. No mesmo 14 de setembro, porém em 1942 – exatamente um ano após a estreia do craque –, o Campeonato Paulista chegava a sua reta final, e o clube esmeraldino, então líder invicto, era o principal candidato ao título. No entanto, a fase brilhante do Palestra foi ofuscada por impasses que aconteceram do lado de fora dos gramados.

Waldemar Fiume e seus companheiros de time presenciaram a perseguição política da qual o clube era vítima. Em decorrência da Segunda Guerra Mundial, o Palestra Italia era visto como uma parte da Itália no Brasil, pois, de fato, foi fundado em 1914 com a ideia de representar a massa italiana que vivia em São Paulo, ou seja, os imigrantes e oriundis. A legislação brasileira, porém, proibia qualquer alusão aos países com os quais o Brasil estava em conflito na guerra, que eram os países do eixo (Itália, Alemanha e Japão).

Acusavam o Palestra de fazer alusão à Itália. Logo, houve uma reunião extraordinária de dirigentes palestrinos, que decidiram por bem mudar o nome da agremiação, caso contrário o clube poderia ter seus bens patrimoniais confiscados pelo governo brasileiro. Assim, em 14 de setembro de 1942, o Palestra, que era líder do Paulistão, saía de cena e passava a figurar com o nome de Sociedade Esportiva Palmeiras.

Logo na semana seguinte, o Verdão realizaria seu primeiro jogo com o novo nome. A partida, válida pela penúltima rodada do Campeonato Paulista, colocaria Palmeiras e São Paulo frente a frente. E se o Alviverde vencesse naquele dia 20 de setembro de 1942, sagrar-se-ia campeão com uma rodada de antecedência.

O duelo diante dos rivais tricolores, portanto, tinha clima de decisão. O Palmeiras entrou em campo com uma bandeira do Brasil, mostrando que, apesar das raízes, era um clube genuinamente brasileiro, e que, ao contrário do que diziam à época, não era inimigo da pátria. Em campo, a resposta foi ainda mais dura. Vencendo o clássico por 3 a 0, na etapa final, o jogador palmeirense Og Moreira sofreu pênalti, que não foi convertido porque os jogadores do São Paulo se retiraram de campo. O árbitro Jaime Janeiro aguardou o retorno do time por aproximadamente 20 minutos. Não voltaram.

Desta maneira, já em seu primeiro ano como jogador alviverde, Waldemar Fiume deu sua primeira volta olímpica, sendo esta, de sabor especial, pois foi um dos títulos mais memoráveis de toda uma história quase centenária do Verdão.

Divulgação _ Fiúme participou do título mundial do Verdão em 1951Pai da Bola conquista o mundo

Nove anos mais tarde, Fiume conquistou talvez o troféu de maior expressão em toda a sua carreira: o Mundial de Clubes de 1951. Mas, para que se possa compreender o grau de importância deste título, é preciso tomar um conhecimento mais amplo dos fatos.

Em 1949, a Seleção Brasileira era considera, por unanimidade, a melhor do mundo. Naquele ano, havia conquistado o título Sul-Americano com históricas goleadas sobre seus adversários: 9×1 Equador, 10×1 Bolívia, 5×0 Colômbia, 7×1 Peru, 5×1 Uruguai e 7×0 Paraguai. Resultados que credenciavam os brasileiros como favoritos ao título da Copa do Mundo de 1950.

Chegou a Copa do Mundo e as goleadas se repetiram: 4×0 México, 7×1 Suécia e 6×1 Espanha. Tudo caminhava bem até a fatídica derrota para o Uruguai por 2 a 1, em pleno Maracanã. A fama de melhor seleção do mundo ficou arranhada com este episódio, logo, aquilo que havia virado o pesadelo dos brasileiros recebeu o apelido de “Maracanazzo”.

Com o intuito de repetir o sucesso técnico e financeiro da Copa do Mundo de 1950 no Brasil, a FIFA, que era presidida pelo Sr. Julius Rilmet, nomeou o engenheiro Ottorino Barassi, secretário geral da entidade, para o Comitê Organizador do Campeonato Mundial de Clubes Campeões. Assim nascia o primeiro campeonato mundial de clubes da história.

O campeonato contou com a participação de oito times, divididos em duas chaves de quatro: Vasco da Gama (Brasil), Áustria Viena (Áustria), Nacional (Uruguai) e Sporting (Portugal), com sede no Rio de Janeiro; Palmeiras (Brasil), Juventus (Itália), Estrela Vermelha (Iugoslávia) e Olympique (França), com sede em São Paulo. Inclusive, este mesmo número de agremiações, as cidades sedes e o modelo de disputa seriam novamente adotados pela FIFA no Campeonato Mundial de Clubes do ano 2000.

Assim como no ano anterior, a decisão do Mundial foi no colossal Maracanã. Palmeiras e Juventus de Turim-ITA foram os finalistas. No primeiro jogo, deu Palmeiras – 1 a 0, gol de Rodrigues. Na finalíssima, o gol do palmeirense Liminha na etapa final da partida garantiu o empate por 2 a 2 e, consequentemente, o troféu para o Verdão. Contundido, Waldemar Fiume não participou da decisão (foi substituído pelo centro-médio Túlio), mas foi figura importante durante toda a campanha.

Desta maneira, Fiume e seus companheiros de time não só garantiram o título mais cobiçado entre os clubes do mundo inteiro como também trouxeram de volta a honra e a dignidade do Brasil no âmbito esportivo.

Despedida e recordes

Após figurar com a camisa do Palmeiras durante 17 anos, conquistar diversos títulos importantes e receber o apelido de Pai da Bola por ser um verdadeiro polivalente, sempre atuando com rara precisão nos mais diversos setores do campo, Fiume se despediu do Alviverde como ídolo incontestável.

Historicamente, é o 4º jogador que mais vezes entrou em campo pelo Verdão. À época em que deixou o Palmeiras, o Pai da Bola era o detentor do recorde de maior número de partidas pelo clube, ou seja, com 601 atuações, foi o jogador que mais vezes havia entrado em campo pelo Verdão em toda história. Bem mais tarde, foi ultrapassado neste quesito respectivamente por Ademir da Guia (901), Dudu (609) e Leão (617).

Além disso, o craque é o 3º maior vencedor em toda história alviverde. Esteve em campo em 337 vitórias do Verdão. Também era o jogador mais vitorioso do clube até o surgimento das “Academias”, quando foi ultrapassado por Ademir da Guia (514 vitórias) e Dudu (340).

Divulgação _ Waldemar Fiume ao lado de seu busto no Palestra ItáliaAdeus e homenagem

O adeus de Waldemar Fiume aconteceu em 17 de setembro de 1958, no empate por 1 a 1 diante São Paulo. Foi um jogo comum, sem festividade e tampouco cerimônia. No mês seguinte a sua despedida, entretanto, eis que o jogador recebe uma homenagem a caráter.

Era outubro de 1958, no estádio Palestra Italia. Havia um mês que o craque realizara sua última partida pelo Verdão. Antes da partida entre Palmeiras e XV de Piracicaba, porém, Fiume entrou em campo antes de a bola rolar e se despediu da torcida. Deu a volta olímpica ao lado dos jogadores juvenis e foi aplaudido quando passou pela fila dos dois times adversários daquela tarde.

Romeu, filho do saudoso roupeiro Tamanqueiro, foi incumbido de colocar uma cadeira para que o craque descalçasse as chuteiras. O capitão Ivan, do Palmeiras, o presidente Mario Beni e o diretor Mario Fruguelli entregaram-lhe a camisa do clube e o convidaram, junto de sua esposa e filho, a assistirem ao jogo na tribuna. Waldemar Fiume não sabia, mas haveria uma surpresa para depois da partida.

Terminada a partida, o craque foi convidado a comparecer aos jardins do estádio. Estava descendo as escadas ao lado da esposa e do filho (à época com 10 anos), já com a bola do jogo entre Palmeiras e XV de Piracicaba que ganhara de presente nas mãos, quando viu o garoto correr. O menino tinha visto a bandeira do Palmeiras cobrindo algo e foi olhar o que havia embaixo. Voltou correndo e, atropelando o protocolo, escancarou: “Pai, você está aqui e está lá fora ao mesmo tempo! Fizeram você de ferro (sic)”. Era o pai, o filho, a bola; Era a estátua do Pai da Bola.

Curiosidades:

– Nasceu em 12 de outubro de 1922, em São Paulo, filho de Francisco Fiume e Stephania da Silva. Morava no bairro da Liberdade e, até os 18 anos, atuou por vários times de várzea da região do Glicério, entre eles Santo Alberto F.C., Juvenil Alfa, Liberdade e Bangu do Glicério.

– Durante a carreira de jogador amador, Waldemar ajudava o pai na gráfica da família. Francisco não queria que o filho seguisse carreira nos gramados.

– Em 1941, antes de ser levado ao Palestra Italia (time do coração do pai italiano), Fiume fez teste no São Paulo F.C., mas não aceitou a proposta feita pelos rivais. Contratado pelo Palestra, estreou no mesmo ano de 1941, virou titular absoluto como centro-médio em 1944 e se consolidou na quarta zaga a partir de 1946.

– Após pendurar as chuteiras em 1958, Fiume foi contratado no final do ano seguinte pelo Bragantino só para disputar o Torneio Final de Acesso junto com outros veteranos. O time fez ótima campanha, mas ficou com o vice-campeonato.

– Morreu no dia 6 de novembro de 1996. No mesmo ano, o vereador Dalmo Pessoa apresentou projeto para rebatizar uma praça paulistana com o nome do ídolo. A proposta foi aceita, e no dia 26 de fevereiro de 1997 uma praça do Jardim das Palmeiras, na Zona Sul da capital, passa a se chamar Praça Waldemar Fiume.

Raio-X do ídolo:

Nome: Waldemar Fiume
Nascimento: 12 de outubro de 1922, em São Paulo
Falecimento: 6 de novembro de 1996, em São Paulo

Jogos pelo Palmeiras: 601
Vitórias pelo Palmeiras: 337
Empates pelo Palmeiras: 120
Derrotas pelo Palmeiras: 144
Gols pelo Palmeiras: 27

Principais títulos: Campeonato Mundial de 1951, Torneio Rio-São Paulo de 1951, Campeonato Paulista de 1942, 44, 47 e 50 e Taça dos Campeões RJ-SP de 1947

Ficha técnica do último jogo:

Palmeiras 1 x 1 São Paulo

Data: 17/9/1958
Local: Estádio do Pacaembu, em São Paulo
Competição: Campeonato Paulista
Publico: 30.212 pessoas
Renda: Cr$ 1.594.525,00
Árbitro: Esteban Marino
Gols: Paulinho, pelo Palmeiras, e Gino, pelo São Paulo.

Palmeiras: Aníbal; Jorge, Valdemar Carabina, Waldemar Fiúme e Geraldo Scotto; Zequinha e Chinesinho; Julinho, Paulinho, Nardo e Ênio Andrade
Treinador: Oswaldo Brandão.

São Paulo: Poi; De Sordi, Mauro, Gérsio e Victor; Riberto e Lanzoninho; Amaury, Gino, Zizinho e Canhoteiro
Treinador: Armando Renganeschi