Departamento de Comunicação

“O que você estava fazendo naquele timaço do Palmeiras?”

Sandro Blum reage com tranquilidade à provocação que costuma escutar dos amigos. O zagueiro gaúcho tinha 25 anos quando desembarcou no Palestra Italia, em janeiro de 1996. Chamara a atenção do técnico palmeirense Vanderlei Luxemburgo ao defender o Juventude-RS, clube que, assim como o Alviverde paulista, era parceiro da Parmalat.

“Sendo sincero, não me contrataram para ser titular. Fui para fazer parte do grupo”, reconhece Sandro. “Mas era disciplinado, dedicado e usava bem a cabeça. Conseguia me destacar no jogo aéreo e atuava com inteligência, antevia a movimentação dos atacantes. Sabia aproveitar as oportunidades que apareciam e, por isso, tive a honra de jogar naquele Palmeiras maravilhoso. Estava no lugar certo, na hora certa.”

O defensor de 1,88 m de altura integrou a Máquina Mortífera, como ficou conhecida a incrível equipe campeã paulista há 25 anos. A referência ao filme de ação que fizera sucesso nos anos 1980 tinha a ver com a forma como o Verdão aniquilava os rivais. Em 30 jogos, foram 27 vitórias (13 delas por goleada), dois empates e uma derrota. O título foi sacramentado com o triunfo por 2 a 0 sobre o Santos, em 02 de junho, no Palestra Italia.

Com 102 gols marcados e apenas 19 sofridos, o Palmeiras terminou a campanha do seu 21º título estadual com o absurdo saldo positivo de 83. Sandro marcou duas vezes, ambas de cabeça, contra Mogi Mirim (3 a 0) e Portuguesa (3 a 1), no Parque Antarctica.

Soldado palmeirense

Nada mal para quem iniciara tardiamente a carreira de jogador. Natural de Três de Maio, cidade situada próxima da fronteira com a Argentina, Sandro trabalhou ainda adolescente como recepcionista em uma empresa. Dos 18 aos 20, serviu ao Exército, onde o porte atlético, por pouco, não o levou a prosseguir na carreira militar.

“Queriam que eu ficasse de todo jeito no quartel, mas o meu sonho era jogar bola”, lembra-se. Seu primeiro clube profissional foi o Dínamo, de Santa Rosa, que naquela temporada subiria para a Primeira Divisão do Rio Grande do Sul. No ano seguinte, teve uma curta passagem pelo Grêmio e atuou no Esportivo, de Bento Gonçalves. Acertou com o Juventude em 1993, meses antes de o clube firmar parceria com a Parmalat.

Além de Sandro, o Juventude também contava com os ex-palmeirenses Galeano (ao fundo) e Dorival Júnior (à direita)

Reforçada com jogadores que haviam defendido o Palmeiras, como o lateral Odair e o volante Galeano, a equipe de Caxias do Sul se sagrou campeã da Série B em 1994. As boas atuações no Brasileirão de 1995, em que o Juventude acabou em décimo lugar (à frente de Corinthians e São Paulo, por exemplo), serviram como vitrine para Sandro.

“Era outubro daquele ano quando o (José Carlos) Brunoro (diretor de Esportes da Parmalat) me telefonou para dizer que eu deveria me apresentar no Palmeiras em janeiro de 1996. A Parmalat era dona dos meus direitos, portanto não houve nem sequer negociação”, conta. “Não foi uma mudança fácil. Até então, eu só havia jogado em clubes gaúchos e, de repente, estava treinando com atletas da Seleção Brasileira. Mas fui bem acolhido por todos e, já na pré-temporada, ganhei um lugar entre os 11.”

Duas palavras?

No Verdão, Sandro jogou com um elenco recheado de craques como Muller (na foto), Djalminha e Rivaldo

Nos primeiros treinos, três integrantes da Máquina Mortífera impressionaram o recém-contratado: os meias Djalminha (“tinha facilidade incomum para jogar”) e Rivaldo (“o jogador mais completo com quem atuei”) e o atacante Muller (“muito inteligente”).

“O time todo era fantástico e estava com a confiança nas nuvens. Sabíamos que encontraríamos dificuldade, mas que éramos superiores aos adversários”, diz Sandro.

Não se tratava de soberba. Na campanha do título paulista, o Palmeiras disputou seis clássicos, com cinco vitórias (2 a 0 e 3 a 2 contra o São Paulo, 6 a 0 e 2 a 0 sobre o Santos e 3 a 1 diante do Corinthians) e um empate (2 a 2 contra o Corinthians).

Sandro dá risada ao se lembrar do discurso feito pelo capitão Cafu após o triunfo sobre o arquirrival em Presidente Prudente – por causa da reforma do Morumbi, a FPF (Federação Paulista de Futebol) levou os clássicos para o interior do estado.

“Na reza depois do jogo, o Cafu falou assim pra gente: ‘Pessoal, só tenho duas palavras para dizer a vocês: Para-béns!’. O nosso vestiário veio abaixo, né?”, rememora.

Formação de jogadores

‘O Palmeiras de 1996 foi um time extraordinário, completamente fora da curva, e por isso nunca será esquecido’, conta Sandro

Sandro Blum permaneceu no Palmeiras até junho de 1997, quando a Parmalat começou a utilizá-lo como moeda de troca. Naquele ano, transferiu-se para o Atlético-MG em decorrência da negociação que trouxe o atacante Euller ao Alviverde e ajudou o time de Belo Horizonte a conquistar a Copa Conmebol. Em 1999, a multinacional de laticínios o emprestou ao Sport a fim de facilitar a contratação do meia Jackson pelo Verdão. O zagueiro ficou três anos em Recife e fez parte da equipe que alcançou as quartas de final da Copa João Havelange, como foi chamado o Brasileiro de 2000.

De 2002 a 2009, Sandro defendeu dez clubes diferentes, o último deles o Novo Hamburgo-RS, time da cidade onde vive atualmente. Após pendurar as chuteiras, continuou envolvido com o futebol. Entre 2012 e 2020, geriu um projeto de formação de jogadores no município de Ivoti (RS) e, neste ano, tornou-se agente de atletas.

“Sempre que viajo a trabalho a São Paulo, sou bem recebido no Palmeiras. A parte mais gratificante da vida é você ser lembrado por algo que fez depois de tanto tempo. O Palmeiras de 1996 foi um time extraordinário, completamente fora da curva, e por isso nunca será esquecido. Tanto é verdade que estamos falando dele 25 anos depois”, diz.